13/05/07 10:46 RIO - Equipe Portelaweb Pedro Migão
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Zé Kétti, A Voz do Morro, Sim Senhor
José Flores de Jesus, o nosso Zé Kétti, nasceu em 16 de setembro de 1921, em Inhaúma, bairro onde viria a passar os seus últimos dias. Seu apelido musical vem dos tempos de infância, quando gostava muito de observar as coisas ao seu redor. Desta faceta de seu temperamento veio o apelido "Zé Quietinho", que depois se transformaria em "Zequéti" e por fim em "Zé Kétti", na década de 50.
Seu primeiro contato com a música aconteceu na infância, acompanhando as festas que seu avô promovia em Bangu, bairro onde o nosso personagem morou em sua tenra infância. Porém, entre 1926 e 28, Zé Kétti mudou-se para Dona Clara, onde viveria até 1937, quando então foi morar no bairro de Bento Ribeiro. Estudou até o primeiro ano do ginásio - atual quinta série do ensino fundamental - e depois foi se formar na denominada "universidade da vida". Perdeu o pai muito cedo e foi criado pela mãe, Dona Leonor, e pelo avô.
O Compositor
Sua vida como compositor de sucesso começa no lendário Café Nice, em 1939. O Café Nice, nesta época, era o ponto de encontro dos compositores e dos cantores famosos da época. Sua estréia em disco ocorreu em 1946 com a música de carnaval "Vivo Bem", gravada por Ciro Monteiro. No mesmo ano grava "Tio Sam no Samba" com o grupo Os Vocalistas Tropicais. Fica seis anos afastado de gravações em disco, mas em 1952 experimenta o seu primeiro sucesso: "Amor Passageiro", gravado por Linda Batista.
Mas seu primeiro grande sucesso viria em 1954, com a música "Leviana", cuja primeira gravação foi do cantor Jamelão. No ano seguinte consolida o sucesso com o lançamento da música "A Voz do Morro", gravada originalmente pelo grupo Vocalistas Tropicais.
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Na década de 60, Zé Kétti encontra o seu apogeu como cantor e compositor de sucesso. São deste período as músicas Opinião (1965), Jaqueira da Portela (1963), Máscara Negra (1967), Diz que Fui por Aí (1964) e As Moças do Meu Tempo (1967), somente para dar alguns exemplos. Faz parte do grupo A Voz do Morro e, em 1964, é uma das atrações do histórico show "Opinião", juntamente com João do Vale e Nara Leão - posteriormente, Maria Bethânia. Além disso, atuou no filme Rio Quarenta Graus (1955).
Entretanto, em 1967 se envolve em polêmica envolvendo a autoria da música "Máscara Negra", a qual é objeto de acirrada disputa judicial. Porém, o veredicto confirma a Zé Kétti a autoria da música, em 11 de novembro de 1969.
Outra característica marcante de Zé Kétti era a sua luta pelo reconhecimento dos direitos autorais dos compositores. Além disso, seu imenso talento esteve intensamente envolvido na resistência ao golpe militar de 1964; porém, devido às suas boas relações com o então governador do Estado da Guanabara Carlos Lacerda, ele jamais seria importunado pela polícia.
A década de 70 marca um período não muito feliz da carreira de Zé Kétti. Os discos lançados nestes anos não alcançaram grande repercussão; segundo alguns críticos, eram trabalhos menores da carreira do cantor e compositor. Os anos 80 marcam um relativo ostracismo de Zé Kétti em termos de disco, que seria resgatado em 1996, com o lançamento do primeiro CD da série "Rio Musical". Neste mesmo ano o cantor Zé Renato lança um CD dedicado à sua obra e em 1997 sai o fascículo de número 32 da série MPB Compositores, da Editora Globo.
Para coroar a sua brilhante carreira, em 1998 Zé Kétti recebe o Prêmio Shell de Música Brasileira, o maior prêmio dedicado à música brasileira. Um merecido reconhecimento a este que foi um dos maiores sambistas da nossa história.
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O Empreendedor
Uma faceta pouco conhecida da personalidade de Zé Kétti é a de empresário. Desde menino, ele já exercia o seu tino para os negócios vendendo laranjas descascadas nos campos de pelada, para ganhar um dinheirinho.
Entre 1963 e 1965, Zé Kétti foi um dos articuladores e divulgador cultural do famoso restaurante e casa de shows Zicartola. No início dos anos 70 ele era dono da Ortensur, empresa de reformas e pinturas. Concomitantemente, ele também era funcionário do Iapetec e representante de um laboratório farmacêutico. Em 1976 lança a MarKétti Transportes Marítimos e Terrestres Ltda., para explorar o transporte marítimo entre São Gonçalo (Pontal de Itaoca) e Paquetá. Antes havia sido dono de uma barraca de peixes na Praça Quinze.
Não se pode esquecer também de suas iniciativas visando à organização dos compositores e à regulamentação das profissões de cantor e compositor.
Zé Kétti e a Portela
Zé Kétti foi levado à Portela pelo compositor Armando Santos, grande baluarte da escola. Por volta de 1945 já fazia parte da Ala de Compositores da escola, embora esta não estivesse organizada como ala, o que ocorreria no início dos anos 50. Magoado com as fofocas envolvendo o samba "Leviana", ele se afastaria da escola na década de 50, encontrando abrigo na União de Vaz Lobo, mas logo retornaria à Portela.
Segundo o escritor Nei Lopes, a opção do compositor pela Portela teria origem em uma briga que Zé Kétti presenciou na Mangueira: ele então preferiu os ares mais tranqüilos de Oswaldo Cruz. Porém, este bairro fica muito próximo a Dona Clara (hoje parte componente de Madureira), onde o compositor passou parte de sua infância e juventude, de modo que é provável que os ecos do samba que vinham de lá tenham atraído o menino que desde muito jovem se interessava por música.
O compositor exerceu, entre outras, a função de relações públicas da escola na década de sessenta e foi um grande pesquisador da história da Portela e das escolas de samba cariocas. Em 1968 foi eleito Cidadão Samba, desbancando famosos sambistas da ocasião.
Zé Kétti teve um único samba-enredo vencedor composto para a Portela: "Viagem Pitoresca Através do Brasil (Rugendas)", de 1962. O curioso é que o samba que foi para a avenida na verdade era a junção de dois sambas, o de Zé Kétti e o do compositor Marques Balbino. Cantando o seu samba, a Portela conquistou o título do carnaval de 1962.
Seu grande amor à Portela pode ser demonstrado através dos sambas de exaltação que ele compôs para a escola, dos quais o mais famoso é "Jaqueira da Portela", de 1963. Este samba retrata um fato histórico da escola: a derrubada da jaqueira à sombra da qual foi fundada a escola, para a construção da primeira quadra - o Portelinha.
O Crepúsculo
Zé Kétti teve dois derrames cerebrais - o primeiro deles em 1987 - que abalaram bastante a sua saúde. Em 1999, já vivendo ao lado da filha Geisa no mesmo bairro de Inhaúma no qual nasceu, sente profundamente a morte da ex-mulher, vindo a falecer dia 14 de novembro de 1999, de complicações renais e pulmonares. Foi-se o homem, nasceu o mito.
Pequeno Histórico
1921 - Nasce em Inhaúma, a 16 de setembro, sendo registrado como nascido a seis de outubro.
c.1928 - Com a morte do avô, a família muda-se para Dona Clara.
1937 - Muda-se com a família para Bento Ribeiro e, logo depois, começa a freqüentar a Portela.
c.1945 - Integra o grupo de compositores da Portela, que ainda não era estruturado como "ala".
1946 - Estréia no disco, com o samba "Vivo Bem", gravado por Ciro Monteiro.
1954 - Sucesso com "Leviana", gravado por Jamelão. Vai para a União de Vaz Lobo.
1955 - Trabalha no filme "Rio Quarenta Graus".
1956 - Sucesso com "A Voz do Morro" .
1962 - Portela ganha o carnaval com o seu samba-enredo Viagem Pitoresca através do Brasil
(Rugendas).
1964 - Atua no show Opinião.
1968 - Em 12 de Fevereiro é eleito Cidadão Samba.
1973 - Deixa de participar ativamente do dia-a-dia da Portela.
1987 - Tem o primeiro derrame cerebral.
1994 - Recebe a Medalha Pedro Ernesto.
1996 - Lança um CD pela RioArte e é homenageado pelo cantor Zé Renato com outro dedicado à
sua obra.
1998 - Recebe o 18º Prêmio Shell.
1999 - Falece a 14 de Novembro.
Equipe Portelaweb - 2000
Pesquisa e criação de texto: Pedro Migão
Revisão ortográfica: Fabrício Soares
Texto protegido pelas leis que regem o direito autoral Proibida a reprodução total ou parcial sem os devidos créditos ou autorização do autor.
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A jornalista e filha de Zé Kétti, Geisa Flores, faz um depoimento sobre o pai.
Eu considero que o compositor Zé Kétti, meu pai, esteve sempre preocupado em levar o samba para todas as camadas sociais, como cronista das desilusões e esperanças dos menos favorecidos; daí se dá o fato de ser intitulado como A Voz do Morro. Suas músicas expressaram o amor e a alegria, mas, sobretudo, a carência e o sofrimento de um povo sufocado pela ditadura militar. Zé Kétti, o sambista mais politizado do Rio de Janeiro, tinha ideais comunistas, e brilhou como compositor nas décadas de maior efervescência nas transformações políticas no país. Ele soube se aproveitar disso.
Zé Kétti, cidadão samba e boêmio namorador, mas também trabalhador da Previdência Social, antigo INSS, de onde era escriturário; deixava o paletó na cadeira, batia o ponto e saía para batalhar pela música popular brasileira, tentando, principalmente, regulamentar a profissão de compositor e cantor, sempre ligado à classe, ele era um agitador. As questões sócio-econômicas estiveram sempre à frente de sua vida pessoal. Lutar pelo samba era se valer dele como porta-voz de importantes reivindicações.
O compositor era multimídia quando a palavra ainda nem era usada. Zé Kétti foi assim, a voz de todos os morros, e dentro do cenário artístico musical, ele conseguiu promover o samba e seus representantes, ele se fez perceber através do gênero, antes bastante marginalizado, que após Zé Kétti passou a ter identidade cultural, pois o Zé, conhecido também com Zé Quietinho, teve um comportamento nada quieto. Ele não parava, parecia ter um bicho-carpinteiro, conseguindo assim colocar o samba, especialmente nas décadas de 50 e 60, nas mais diversas áreas.
Foi gravado por mais de 40 nomes da MPB e na época pelos mais concorridos cantores, como Linda Batista, Jorge Goulart, Ângela Maria, Dalva de Oliveira, Elis Regina, Jair Rodrigues, Caubi Peixoto, Nara Leão, MPB - 4, Elizeth Cardoso, Ciro Monteiro, Wilson Simonal, Paulinho da Viola...
Participou como ator, cameraman e fez trilha sonora para vários filmes: Rio 40 graus, Rio Zona Norte, Boca de Ouro (de Nelson Pereira Santos), A Falecida (Nelson Rodrigues), Gimba, o Desafio, Mar Corrente, O Homem do Rio, A Grande Cidade (de Cacá Diegues), Luar Sobre Parador, filme internacional, em que contracenou com Grande Otelo e Jece Valadão, ficando conhecido nacionalmente.
Zé Kétti foi do Cinema Novo, do Café Nice, do Zicartola, do Teatro Opinião, das Rodas de Samba nos quintais e botequins, foi boêmio, foi Zé das Madrugadas, foi das Escolas de Samba Portela, União de Vaz Lobo e Mangueira, dos salões de Carnaval, dos festivais de música, do rádio, da televisão, das manchetes de revistas e jornais, foi líder pelos Direitos Autorais, dos movimentos políticos (sutilmente), foi o Rei dos Terreiros, foi das Cabrochas e Colombinas, da Música Popular Brasileira, do samba, das multidões, do povo, foi um mestre.
Zé Kétti, o Zeca, atuou como o Rei Negro do Samba e lutou pelo que mais acreditou na vida: a Música. E a luta valeu.
Partiu com 60 anos de carreira, deixando 300 composições. Com essa bagagem, ao meu ver, José Flores (Kétti) de Jesus, o meu velho pai, é para a história da Música Popular Brasileira, a maior expressão e o mais significativo e autêntico representante do samba no cenário sócio-cultural do Brasil."
Equipe Portelaweb - 2000
Texto revisado por Fabrício Soares
Texto protegido pelas leis que regem o direito autoral Proibida a reprodução total ou parcial sem os devidos créditos ou autorização do autor.
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